Há menos liberdade intelectual na ciência atual

Para Harald zur Hausen, Nobel de Medicina, antes era mais fácil pensar fora da caixa

O alemão Harald zur Hausen, 74, diz, com seu tom de voz sempre baixo,  que, apesar da internet, é mais difícil para um cientista jovem fazer um  bom trabalho hoje.
"Há enorme pressão para publicar [artigos científicos] rápido. É  contraprodutivo. Precisamos dar aos cientistas jovens um período de mais  liberdade, estimular alguma independência intelectual, para que desenvolvam idéias por eles mesmos."*
Com essa pressão, a tendência é fazer o que todos já estão fazendo -é  mais garantido do que apostar alto.
Hausen, que esteve em São Paulo para um encontro organizado pelo Hospital A.C. Camargo, fala por experiência própria. Quando todos  achavam que o câncer no colo de útero era causado pelo vírus da herpes,  ele apostou no HPV. Fracassou por cinco anos, até que, em 1983, mostrou  que estava certo. Ganhou o Nobel em 2008. Quando sua neta de três anos soube, começou a  chorar. Ninguém entendeu, e ela explicou, inconsolável: "Também quero um  Nobel."
Se a garota quiser levar o projeto adiante, Hausen tem um conselho. "É  sempre bom passar pelo menos dois anos fora do seu país de origem", diz.  "Justamente para adquirir novas ideias, novas maneiras de pensar, e  também um estilo de vida diferente."
Foi o que ele fez na década de 1960, quando morou nos EUA. A Alemanha,  diz, tinha sofrido com a saída de bons cientistas durante o nazismo -"e  leva muito tempo para um país se recuperar disso".
"Nos EUA, você discutia suas idéias, ainda que fossem loucas, com muita  gente boa. Satisfação que eu não tinha, antes, na Alemanha."
Se jovem hoje, se empolgaria com áreas em ascensão como os mecanismos  moleculares do envelhecimento ou células-tronco -boas para candidatos a  Nobel, diz.
Sobre a terapia genética (a inserção de genes, às vezes utilizando um  vírus, nas células de alguém para tratar uma doença), diz que "é um  conceito promissor, mas até agora o seu sucesso foi extremamente limitado"

Fonte: Folha de São Paulo