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A multiplicação do Velho Chico

Projeto que prevê a transposição do rio São Francisco levará água para 12 milhões de pessoas em quatro estados nordestinos até 2025

Um empreendimento gigantesco e considerado prioritário para o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), a transposição do São Francisco é a solução proposta pelo governo para atenuar o problema da seca crônica que castiga o semiárido. A promessa de levar água para 12 milhões de pessoas a 390 municípios do Ceará, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte deve ser cumprida até 2025.

'A grande finalidade do programa é dar garantia hídrica ao Nordeste Setentrional', diz o secretário-executivo da obra, João Santana. O Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional, nome oficial da transposição, integrará as bacias dos rios intermitentes do semiárido por meio de um desvio contínuo de 26 mil metros cúbicos de água por segundo - ou 1,4% da vazão garantida pela barragem de Sobradinho. O volume disponível para retirada da barragem poderá chegar a 127 metros cúbicos por segundo.

A obra de engenharia que envolve a construção de aquedutos, túneis e reservatórios foi iniciada em 2008, a um custo de R$ 4,5 bilhões. O projeto prevê a construção de dois grandes canais que levarão água por meio de bombeamento para áreas distintas.

eixo Leste, que tem 220 quilômetros de extensão, retirará água da barragem de Itaparica, no município de Floresta, Pernambuco, e a levará para a região central do estado e para a Paraíba. Esse trecho está 41% finalizado e, segundo o Ministério da Integação Nacional, responsável pela obra, será entregue em dezembro de 2010. O eixo Norte está com avanço de 24% e tem previsão para ser concluído em 2012. Com 420 quilômetros de extensão, retirará água de Cabrobó e abastecerá as cidades no sul do Ceará, no oeste da Paraíba e no Rio Grande do Norte. De acordo com Santana, 10 mil operários diretos trabalham a todo vapor para que a obra possa ser finalizada no prazo.

Os 2.700 quilômetros de extensão do Velho Chico banham os estados de Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Sergipe e Alagoas. Sua Bacia hidrográfica também envolve parte do estado de Goiás e o Distrito Federal. Ele teve - e tem - uma importância enorme para o Nordeste do país. Estima-se que em suas margens haja de 800 mil a um milhão de hectares com possibilidades de irrigação - desses, 340 mil hectares já estão irrigados, e o avanço de áreas que utilizam o sistema é da ordem de 4% ao ano.

Para a diminuição do impacto ambiental provocado pela implantação e operação do empreendimento, o Ibama exigiu que fossem adotadas medidas de preservação para realização da obra. Para isso foram criados 36 Programas Básicos Ambientais (PBAs), entre os quais estão a proteção à fauna, à flora e aos sítios arqueológicos e de educação ambiental. O programa de proteção terá um custo estimado em R$ 700 milhões.

Ainda como parte das exigências feitas por organismos de preservação do meio ambiente, criou-se o Programa de Revitalização dos rios São Francisco e Parnaíba. Esses processos de revitalização envolvem a proteção de microbacias (nascentes desprotegidas), assistência a colônias de pescadores, construção de barragens em afluentes e tratamentos de esgotos de cidades e vilas localizadas às margens dos rios. Esse projeto custará cerca de R$ 1,7 bilhão. Há também o Programa Água Para Todos, que prevê a implantação de sistemas simplificados de abastecimento de água em 106 municípios.

A justificativa para a obra é dar garantia hídrica ao Nordeste Setentrional, mas especialistas avaliam que o problema da região não é de escassez. De acordo com o pesquisador João Suassuna, da Fundação Joaquim Nabuco, em Pernambuco, o Nordeste brasileiro tem muita água. O cálculo é de que as represas da região tenham estocados cerca de 37 bilhões de metros cúbicos, o maior volume disponível entre as áreas semiáridas do mundo. 'O que não temos é uma política efetiva, que faça com que essa água que já existe chegue nas torneiras da população', diz.

O São Francisco hoje possui um volume alocável (retirado do rio para fins de irrigação e abastecimento, que não retornam ao leito d'água) de 360 metros cúbicos por segundo. Porém, os volumes outorgados (projetos para os quais já foi concedido o direito de uso da água) já chegam a 333 metros cúbicos por segundo, de acordo com o pesquisador. 'Sobram 25 metros cúbicos por segundo para serem utilizados num projeto como a transposição, que demanda uma média de 65 metros cúbicos por segundo e uma máxima de 127 metros cúbicos por segundo. Ou seja, o rio já não dispõe da quantidade de água demandada pelo projeto', afirma.

Segundo o secretário-executivo da obra, o volume de água retirado com a transposição (inicial de 26 metros cúbicos por segundo), e que é questionado por Suassuna, ainda é menor que a outorga concedida a estados como Minas Gerais, por exemplo, onde o Projeto Jaíba tem uma autorização para a exploração de 80 metros cúbicos por segundo. 'Se a nossa outorga é de 26 metros cúbicos, como vamos prejudicar o rio?', diz João Santana.

Números do rio São Francisco

Extensão - 2.700 km
Eixo Leste - 220 km de extensão (até 2010)
Eixo Norte - 420 km de extensão (até 2012)
Beneficiados - 12 milhões de pessoas
Desvio de água - 26m3 por segundo (ou 26 mil litros)
Operários - cerca de 10 mil
Estados beneficiados - Ceará, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte
Total de municípios beneficiados - 390
Canais - 622 km
Reservatórios - 35
Aquedutos - 27
Estações de bombeamento - 9
Túneis - 8

Fonte: Globo Rural