Indústria de portas abertas, mas sem mão-de-obra

Alguns setores sofrem com a falta de profissionais qualificados. Formam-se 12 engenheiros para a indústria de álcool por ano no Brasil, 31 engenheiros navais e 74 engenheiros de minas, por exemplo.

A indústria brasileira está de portas abertas para os trabalhadores. Em muitos setores, as portas estão escancaradas. Mas, ainda assim, ninguém entra. Qual é o problema? O repórter Tonico Ferreira tem a resposta.


Três milhões de carros por ano saem das fábricas instaladas no Brasil. O setor cresce à taxa anual de 20%. Para atender à procura por carros, a indústria abriu 14 mil vagas no ano passado, quase todas para pessoas qualificadas.


Uma montadora de automóveis, que é uma das maiores no país, não só teve que aumentar rapidamente a produção como enfrentou um desafio extra: com a globalização da economia passou a desenvolver projetos de novos modelos de carros para o mercado mundial. Precisou dobrar a sua equipe de projetistas: contratou 600 novos engenheiros em apenas dois anos. Não foi fácil.


A montadora encontrou apenas 300 profissionais com experiência. A solução foi chamar 300 recém-formados. Para a jovem engenheira mecânica Helena Osório, uma oportunidade de início de carreira.


“A gente tem muitas opções de treinamento, treinamento no exterior, a gente está em contato com toda a nova tecnologia que o mercado pode oferecer. É um ramo bastante promissor”.


“Ou você paga para o engenheiro experiente e paga muito, inflaciona o mercado, ou você treina os engenheiros novos para que você consiga uma força de trabalho com custo ainda competitivo”, explica o engenheiro-chefe Pedro Manuchakian.


O sistema de ensino não forma os profissionais que a economia exige. A Petrobras, por exemplo, acaba de encomendar 46 petroleiros aos estaleiros nacionais. Mas o Brasil forma apenas 31 engenheiros navais por ano.


Até a indústria do álcool, orgulho nacional, está mal servida. Formam-se 12 engenheiros especializados na área por ano.


Noventa novas usinas de açúcar e álcool estão em implantação. A indústria de máquinas já garantiu os equipamentos e há áreas para as plantações. O risco é a falta de pessoal.


“Há uma carência também para operadores de máquinas, de tratores, de colhedeiras e de máquinas de plantio. Se nós temos hoje um problema nessa expansão eu diria que o problema está centrado na questão da mão-de-obra”, disse Antonio de Pádua Rodrigues, diretor da União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Única).


A mineração, que é chave na pauta de exportação, também vive escassez de profissionais qualificados. Os 74 engenheiros de minas que se formam por ano são disputados por sete mil empresas. Só a maior delas tem planos de empregar mil nos próximos cinco anos, diz a diretora de recursos humanos, Maria Gurgel.


“Temos engenheiros, mas não necessariamente nas especialidades que nós precisamos. Então nós trazemos de outras formações e formamos dentro de casa”.


Outros setores decisivos: gás e petróleo. Com investimentos anuais na casa de US$ 20 bilhões, estima-se que até 2009 será necessário empregar 112 mil profissionais. O Prominp, um programa governamental de qualificação de mão-de-obra, abriu 953 cursos.


“O desafio que nós temos é usar esses investimentos no setor de petróleo e gás pra promover o desenvolvimento de maneira competitiva da nossa indústria. Para que isso tudo seja feito no Brasil por brasileiros, porque senão a gente vai ter que trazer trabalhadores de fora”, disse José Renato de Almeida, coordenador do Prominp.


Quem se qualificar, vai aproveitar a boa maré. Num curso de tubulações para gás e petróleo no Rio de Janeiro, os alunos têm um horizonte invejável de salário.
“Na faixa de R$ 10 a 12 mil, nível 2. Nível 1 está na faixa de R$ 7, R$ 8 mil”, afirma Walter Fabrício, técnico de manutenção.


Já alguns jovens aprendem montagem de esquadrias no Senai, em São Paulo. Estão em busca do primeiro emprego e a construção civil é um bom caminho.


“Se a gente for numa empresa e estiver precisando de montadores, nós vamos com certeza ser os primeiros a ter essa oportunidade de trabalho”, disse o estudante Gustavo Sakai.


“Você tem um conhecimento a mais que um concorrente no caso. Então acho que conta muito. Com certeza a gente vai conseguir emprego, a gente está batalhando para isso”, disse o estudante Bruno Lima.

Fonte: JORNAL DA GLOBO